terça-feira, 14 de novembro de 2006

Arouca na primeira metade do século passado

A exploração de volfrâmio em Arouca
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«Os pequenos lugarejos, que ao longo de séculos ou mesmo milénios foram sustentando gerações sem horizontes nem futuro, transformaram-se a partir de 1939 na terra prometida, que atraía multidões. A guerra, que se alastrou aos quatro cantos do mundo, transformou a região inóspita, que os habitantes consideravam um inferno, num espaço gerador de vinganças e felicidade.
Depressa Rio de Frades, Regoufe, Janarde, Silveiras, Alvarenga e outros lugares de arremessados nomes, perdidos nos confins remotos a nascente do concelho de Arouca, se transformaram em pequenas “cidades”, providas de luz eléctrica, que, na sede do concelho, era privilégio de apenas alguns, e para onde a estrada se dirigia a toda a velocidade, rasgada na rocha, serpenteando a montanha irregular, para rapidamente facilitar o transporte do minério que, enriquecendo alguns, iria contribuir para o maior holocausto que o mundo já conhecera.
Arouca, minério ou volfrâmio significavam uma e a mesma coisa para uma multidão de gente dos concelhos vizinhos que, dia a dia, enchendo camionetas ou táxis, se dirigiam à vila, para daí iniciarem a longa caminhada que os levava ao sítio da fortuna.
Na vila animou-se o comércio, principalmente o fornecedor de alimentos, na razão inversa do racionamento de bens imposto pelo conflito mundial. Alastrava o contrabando. A gente honesta desta região rural, que não vivera a agitação política das lutas liberais e das pequenas sacudidelas da implantanção da República, não conservava memória, não resistia à tentação da riqueza fácil que lhe batia à porta.
Terra de lavradores, num minifúndio que não permitia grandes distinções entre o proprietário e o rendeiro, salvo na mesa mais abastada e na roupa domingueira, ainda no respeito/medo que os bons costumes recomendavam, via-se confrontada nos finais de 1939 com a invasão de gente de toda a espécie, aventureiros quase todos, desprovidos de fortuna e sem nada a perder na vida.
A terra era fonte certa de alimentação para os proprietários e os celeiros o melhor banco. No entanto, para as numerosas famílias que constituíam a grande massa de assalariados agrícolas e rendeiros, “os brasis” estavam agora por trás da montanha, a uns vinte quilómetros de distancia e custavam apenas algumas horas de jornada, sem necessidade dos papeis, que a maioria não sabia escrever, nem da carta de chamada, que quase todos não sabiam ler, que eram exigidos a quem quisesse embarcar para Terras de Santa Cruz.»
in VILAR, António, “O Volfrâmio de Arouca”, Câmara Municipal de Arouca, 1998, pág. 98

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