sábado, 10 de fevereiro de 2024

O médico cirurgião oftalmologista natural da casa da Vinha de Rossas

Com a recente descoberta e visita ao jazigo onde se encontra sepultado, dei por concluída a dificilíssima pesquisa sobre a história de vida - e que história! - de António Ferreira dos Santos Vasconcelos, o médico cirurgião oftalmologista natural da casa da Vinha de Rossas.

Nesse jazigo, na Rua 20 do Cemitério dos Prazeres, em Lisboa, encontram-se inumados, desde 1913, António Ferreira dos Santos Vasconcelos e António Fonseca de Vasconcelos, pai e filho, ambos médicos, os dois falecidos em 1908. E estão ali apenas desde 1913, porque à data da sua morte não havia ainda aquele jazigo da «F.ª Fonseca Vasconcellos» nem se previa sequer tão prematuro infortúnio. Acresce que, apesar de terem falecido no mesmo ano, com diferença de apenas seis meses, não foram sequer sepultados no mesmo cemitério. O filho, que faleceu primeiro, foi sepultado no cemitério do Alto de São João, também em Lisboa; o pai, que faleceu depois, foi sepultado no cemitério dos Prazeres, mas num outro primeiro jazigo. A reunião dos dois deu-se apenas após a transladação dos restos mortais de ambos para o jazigo atual.

Capela Jazigo da «F.ª FONSECA VASCONCELLOS», Cemitério dos Prazeres, Lisboa

Como referido, ambos faleceram em 1908: o filho em 20 de janeiro e o pai em 14 de julho. Coincidiram com o terminus do curso de medicina do filho os primeiros sintomas de Tuberculose Pulmonar do pai. Pelo Natal de 1905 já aquele então estimado rossense se viu obrigado a repouso e pelo Verão de 1907 tentou mesmo a cirurgia, tendo-se deslocado à Alemanha para esse efeito. E foi precisamente aí, em Berlim, onde se encontrava em tratamento, que, volvidos apenas seis meses sobre o falecimento de seu filho, por acometimento fulminante da mesma doença, morreu António Ferreira dos Santos Vasconcelos.

Excerto do Assento de Óbito de António Fonseca de Vasconcelos

Excerto do Assento de Óbito de António Ferreira dos Santos Vasconcelos

Recortes do jornal "Gazeta de Arouca", de 1905, 1907 e 1908

A circunstância de ambos terem sido sepultados em Lisboa, deve-se ao facto de aí residirem à data da respetiva morte, em virtude do casamento de António Ferreira dos Santos Vasconcelos, que aí se deu, na paróquia de São José, em 1881, com D. Josefina Henriqueta da Fonseca, natural de Porto Alegre, Brasil, filha de pai português e mãe brasileira. À data do casamento (testemunhado, entre outros, pelo parente e conterrâneo Doutor Inácio Teixeira Brandão de Vasconcelos, então Conservador dos Registos da Comarca de Arouca), António Ferreira dos Santos Vasconcelos, já tinha deixado a freguesia de Rossas para estudar e entretanto residia em São Cipriano, freguesia de Paços de Brandão, concelho da Feira. E foi aí, em Paços de Brandão, que residiram logo após o casamento, onde tiveram os seus três filhos, sendo António da Fonseca Vasconcelos, nascido em 1882, o primogénito.

Assento de Casamento de António Ferreira dos Santos Vasconcelos

António Ferreira dos Santos Vasconcelos formou-se em medicina e especializou-se em oftalmologia, tendo-se debruçado particularmente sobre a oftalmia simpática, que, resumidamente, consiste na inflamação que ocorre numa vista após lesão ou cirurgia na outra. De resto, foi com breves considerações sobre essa problemática que, em 1878, defendeu a sua especialidade perante todo o corpo docente da Escola Médico-Cirúrgica do Porto. E foi também aqui, como já referido, que o seu filho se formou também em 1905.

É muito provável que o facto de, na sua juventude, ter visto o seu parente e vizinho capitão Feliciano António Ferreira de Vasconcelos, a sofrer, sem vista e acamado, tenha influenciado o então, muito provavelmente, designado "Tonito da Vinha", a seguir o estudo das delicadas implicações dos olhos. Se é que aquele não o ajudou mesmo nesse objetivo. O capitão da Comenda veio a falecer em 1873, precisamente no ano em que o jovem António iniciou os seus estudos na Escola Médico-Cirúrgica do Porto. E este andava já no terceiro ano, quando, em 1876, apadrinhou o neto daquele, António Ferreira de Vasconcelos. Em 1892, quando aceitou apadrinhar a sobrinha Josefina, filha de Maria Teixeira de Vasconcelos e Manuel Fernandes, da Portelada, Lourosa de Matos, já não veio a Urrô, onde se realizou o batizado da neófita, tendo passado procuração para o efeito a seus pais. Já vivia definitivamente em Lisboa, no Segundo Andar do n.º 50 da Avenida António Augusto de Aguiar.

Efetivamente, depois de se formar, António Ferreira dos Santos Vasconcelos, só muito esporadicamente voltou ao seu torrão natal, onde havia nascido em 1853. E depois de se mudar em definitivo para Lisboa é mesmo provável que só tenha regressado a Rossas para o funeral de seu pai em 05 de Abril de 1906, quando se encontrava já acometido das infeções pulmonares. Havia já alguns anos que os seus pais, António Ferreira Vaz e Maria Carolina Teixeira de Vasconcelos, tinham deixado a casa da Vinha e moravam no lugar de Zendo, onde lhes sobreviveu a sua mãe até 1914.

Assento de Batismo de António Ferreira dos Santos Vasconcelos

Sua mãe, Maria Carolina Teixeira de Vasconcelos, nasceu na casa da Vinha, em 1834. Era filha de Maria Teixeira de Vasconcelos, da casa de Sequeiros, e João José dos Santos, da casa da Vinha, viúvo da prima paterna daquela e filho natural de Mariana Gomes dos Santos, da casa da Vinha, perfilhado pelo Reverendo Reitor Manuel José Ferreira Brandão, da casa da Cavada. António Ferreira dos Santos Vasconcelos era tio paterno de, entre outros, Maria Teixeira de Vasconcelos que casou com José Soares de Pinho Brandão, da casa de Telarda de Baixo, sendo que este último era já primo direto materno daquele, com ascendência comum na casa de Sequeiros.

domingo, 5 de novembro de 2023

A Sangria e o ofício de Barbeiro Sangrador

Este fim-de-semana consegui dedicar umas horitas aos meus "PINHOS", dos lugares de Rossas e da Leira, da freguesia de Rossas. Detive-me particularmente em torno do meu octavô Manuel de Pinho, que residiu no lugar de Rossas, junto à Casa da Comenda, em virtude do seu peculiar ofício de mestre barbeiro sangrador, talvez até mais sangrador do que barbeiro, dada a maior frequência com que aparece assim referido, nomeadamente, em vários testamentos que redigiu a pedido na primeira metade do século XVIII.

Talvez devido a esse seu ofício, Manuel de Pinho e sua mulher Maria Teixeira, foram ainda das relações e confiança do comendador de então, Frei D. António Manoel de Vilhena, o qual, de resto, num raro gesto de consideração, apadrinhou presencialmente uma das filhas daqueles, Eufrásia Teixeira de Pinho, batizada na matriz de Rossas, no dia 23 de Fevereiro de 1754.

Quanto ao peculiar ofício, que naquela altura não era assim tão peculiar nem incomum - já que, tal como parteiras, era frequente haver pelo menos um em cada freguesia -, até finais do século XVIII, os “médicos”, inspirados pelos desígnios da medicina antiga, emitiam diagnósticos e receitavam mezinhas, convictos que cada pessoa era fruto da combinação de porções variáveis de fogo, terra, água e ar. Defendiam também que a combinação destes quatro elementos no organismo, dava origem a quatro humores diferentes: o sangue (produzido pelo fígado), a bílis amarela (produzida pelo fígado), a fleuma (produzida pelo cérebro) e a atrabílis ou bílis negra (produzida pelo baço). Tal como as suas qualidades originais (o quente, o frio, o seco e o húmido), esses fluidos estavam submetidos a forças internas ou externas capazes de alterá-los (os pneumas). A origem das doenças era consequência do acumular desses líquidos orgânicos numa dada região do corpo. Todavia, defendiam que o organismo era portador de uma força restabelecedora que lhe era intrínseca, pelo que o próprio corpo procurava descartar-se naturalmente dos efeitos nocivos de qualquer desordem humoral, recorrendo às secreções. Deste modo, a fleuma (fria, húmida e transparente), era expulsa pelo nariz, nos resfriados; a bílis (amarela, quente e seca), era excretada pelo vómito, nas perturbações digestivas; a atrabílis (escura, fria e seca) era expulsa pelas fezes, nas afeções intestinais, enquanto o sangue (vermelho, quente e húmido), se libertava das feridas e acompanhava a expetoração das doenças pulmonares.

Por outras palavras, a saúde era o resultado de uma combinação humoral harmoniosa e a doença era consequência de uma rutura nesta estabilidade natural. Daí que o tratamento de qualquer doença, visasse neutralizar a ação dos humores putrefactos. Para tal, eram prescritos regimes alimentares e medicamentos com qualidades antagónicas às substâncias nocivas que dominavam o organismo, assim como a sangria, que permitia escoar os humores perniciosos que circulavam na área afetada. Práticas como a sangria e a aplicação de sanguessugas, eram correntes nessa época. Eram tarefas executadas por barbeiros, cumulativamente com o corte de cabelo, a feitura de barbas e a extração de dentes, dada a sua grande habilidade manual. Alguns barbeiros podiam até realizar cirurgias, eram os “cirurgiões barbeiros”.

A aprendizagem deste ofício processava-se por conhecimento oral e empírico. No entanto, onde existiam regulamentos para o exercício dos mesmos, era defendida a hierarquia entre os saberes de médicos, cirurgiões e barbeiros. Aos primeiros competia a prescrição e aos últimos a execução. Os barbeiros sangradores nunca deveriam sangrar sem ordem dos médicos, pois corriam o risco de provocar danos irreparáveis.

Os mais entendidos advogavam a sangria derivativa, realizada através de corte no local mais próximo da inflamação, para evitar que o humor doentio se espalhasse pelo corpo, caso a incisão fosse efetuada longe da região afetada, como faziam os partidários da sangria volumosa.

As funções de uma sangria eram múltiplas, a saber: Evacuação: expulsão de humores nocivos que agiam sobre determinado ponto do corpo; Diversão: enganar o fluxo sanguíneo e desviá-lo para o lado oposto, banindo derrames na parte lesada; Atração: levar o humor a uma parte específica, provocando a menstruação, por exemplo; Alteração: modificação da qualidade do humor maligno preponderante; Preservação: conservação dos humores sãos, acautelando uma moléstia; Aliviação: minorar dores ou abaixar a temperatura do corpo, no caso de febres.

O desempenho do mester de barbeiro sagrador exigia ainda determinado perfil: ser jovem para não lhe tremerem as mãos e ter boa vista. Ter experiência para saber distinguir uma veia de uma artéria, conhecendo quantas veias existem no corpo humano, o seu nome, distribuição e quais as sangráveis. Devia, de resto, estar bem provido de lancetas: instrumentos com lâmina curta.

Com efeito, a sangria exigia o conhecimento do confuso mapa do sistema venoso. Segundo os maiores entendidos, era possível sangrar 42 veias: dezoito na cabeça, doze nos braços e doze nos pés. Para combater catarros e doenças da cabeça, sangrava-se atrás das orelhas. Na testa para curar oftalmias. No canto dos olhos, para curar enfermidades na face, vermelhidão na vista ou cataratas. Debaixo da língua para livrar o paciente de dores de garganta. Sangrava-se também, dentro e fora do nariz e nos lábios, bem como nos braços, mãos, pernas e pés. Apenas as axilas eram poupadas. A sangria era usada como anestésico, anti-inflamatório, antifebril e abortivo. Através dela se combatia também, cefaleias, tumores e hemorragias.

A sangria deveria ser executada com o paciente deitado. Os instrumentos utilizados no corte variavam de acordo com o local a sangrar. Para uma remoção profunda eram usadas a lanceta e as sanguessugas. Já para humores superficiais, utilizava-se um recipiente de vidro, conhecido por ventosa e de tamanho variável. Recorria-se ainda a uma bacia para recolher o sangue e a pós restritivos para estancar este após o corte.

Depois de sangrado, o paciente ficava em repouso e não podia dormir durante a primeira hora, nem deitar-se sobre a zona do corte, devendo abster-se do consumo de alimentos indigestos, devendo seguir a dieta prescrita pelo médico.

Em 1628, o inglês William Harvey (1587-1657), comprovou a circulação sanguínea, lançando as bases para contestar o fundamento da sangria. Todavia, afamados médicos e cirurgiões portugueses, persistiam em encarar a sangria como uma rotina de tratamento, não só eficaz, como imprescindível, que era executada por barbeiros sangradores, nas suas tendas, nos domicílios dos pacientes, assim como nas prisões e hospitais.

A resistência em adotar teorias resultantes de estudos experimentais persistiu para além da Reforma Pombalina da Universidade, em 1772. A prática da sangria levaria ainda cerca de cem anos até deixar de ser prescrita por médios e cirurgiões.

O ofício de sangrador foi extinto por Lei de 13 de Julho de 1870. Até então, cumpria-se o adágio:

“Sangrai-o, purgai-o, e se morrer, enterrai-o”.


FONTE: Texto a itálico transcrito do Blog "Do Tempo da Outra Senhora", in www.dotempodaoutrasenhora@blogspot.com | BIBLIOGRAFIA: GRANDE ENCICLOPÉDIA PORTUGUESA E BRASILEIRA. Vols. 4, 6, 17, 26. Editorial Enciclopédia, Limitada. Lisboa, s/d.; NUNES LIAM, Duarte. Livro dos Regimentos dos Officiaes Mecanicos da Mui Nobre e Sempre Leal Cidade de Lisboa (1572), Coimbra, Imprensa da Universidade, 1926; PIRES, A. Tomaz. Cantos Populares Portuguezes. Vol. IV. Typographia e Stereotipía Progresso. Elvas, 1912; ROLAND, Francisco. ADAGIOS, PROVERBIOS, RIFÃOS E ANEXINS DA LINGUA PORTUGUEZA. Tirados dos melhores Autores Nacionais, e recopilados por ordem Alfabética por F.R.I.L.E.L. Typographia Rollandiana. Lisboa, 1780; SANTOS, Georgina Silva. A Arte de Sangrar na Lisboa do Antigo Regime, in Tempo, nº 19. Rio de Janeiro, Julho de 2005.

domingo, 16 de abril de 2023

A propósito do culto e festa da Rainha Santa Mafalda

No ano passado completaram-se 230 anos sobre a beatificação da Rainha Santa Mafalda, confirmada por breve apostólico de 27 de Julho de 1792. No ano seguinte ao da beatificação, de 15 a 21 de Junho, depois de devidamente engalanado o Mosteiro, realizaram-se os majestosos festejos desse acontecimento, tendo por ponto alto a trasladação das relíquias da novel beata do túmulo de pedra em que repousavam para a imagem e urna relicário em que hoje se encontram.

Este acontecimento, embora decorrente do primeiro, não foi menos significativo que aquele, porquanto, tendo a beatificação demorado mais de cento cinquenta anos e ficado aquém do pretendido, os festejos e a colocação em exposição permanente e visível das relíquias ao nível das imagens dos demais Santos concretizava um desejo maior das religiosas e do povo que há muito haviam “canonizado” essa prodigiosa e virtuosa Senhora que escolheu o Mosteiro de Arouca para viver e nele ficar sepultado o seu sagrado corpo.

Com efeito, há muito que o povo ao título de Rainha lhe havia acrescentado o de Santa, tal era a tradição desta Senhora, em vida, ter praticado com devoção e religiosidade intensa todas as virtudes cristãs e, depois de morta, intercedido pela cura de múltiplas enfermidades e pela definição e resolução de diversas causas. Tudo tendo tomado contornos de maior verosimilhança e santidade a partir de 1616, quando algumas monjas procurando saber como estaria o corpo de Dona Mafalda abriram a sua urna e o acharam incorrupto e perfumado.

Daí em diante aumentou significativamente o seu culto, de tal forma que, em 1704, também a sua urna foi deslocada do local onde se encontrava desde que a mulinha ali havia trazido a tumba com o seu corpo, para altar provisório junto ao coro e, posteriormente, em 1718, para o altar onde se encontra atualmente.

Junto ao túmulo de pedra, que substituiu o primitivo de madeira, sobre o qual se fez repousar uma estátua jacente, sempre arderam lâmpadas de prata, durante todos os dias do ano, ali acorrendo diariamente as monjas e também imensos devotos, de ambos os sexos e todas as dignidades, manifestando culto público igual ao dos outros Santos.

Porquanto, levar a notícia e testemunho das graças desta Serva de Deus à Causa dos Santos e colocar as suas relíquias num túmulo e altar dignos da sua santidade, era o mínimo que se nos impunha perante o facto de uma predestinada aos palácios da realeza ter escolhido o nosso mosteiro para seu paço, ali estabelecer a sua fonte de graças celestes e dali subir aos Céus depois de nos confiar a guarda do seu corpo.

Porém, vistos estes últimos 230 anos, a beatificação foi (até hoje) o facto mais relevante da história da Rainha Santa Mafalda. E aquela sumptuosa comemoração acabou por ser o clímax da história do Mosteiro. Daí em diante, apesar da obra que se fez, este apenas conheceu o declínio do seu objeto e não mais se insistiu na canonização da sua bem-aventurada Benfeitora. Não mais se deu sequer testemunho e/ou tomou nota oficial dos milagres que eventualmente terá continuado a operar entre nós.

Estamos, pois, em falta para com a nossa Rainha Santa! A menos que se considere, consciente ou inconscientemente, que os milagres que operou entre nós aconteceram apenas em função e benefício do seu processo de santificação. Certamente que não. Não terá deixado a ditosa Senhora de obter para os seus devotos as graças que lhe rogam. E estas não serão hoje menores que naqueles outros tempos.

Disso mesmo nos deu testemunho ainda não há muitos anos o nosso conterrâneo Cónego Joaquim Mendes de Castro (1920-2016), em formato de livro – um pequeno grande livro que guardo entre os meus prediletos sobre a história e devoção de Santa Mafalda – e em cujas palavras de abertura relata a graça que ele próprio terá recebido por intercessão desta nossa e sua Santa protectora.

Os bem-aventurados não têm validade nem as graças divinas estão limitadas a qualquer stock. Mas dependem da perceção, testemunho, julgamento e divulgação dos fiéis, porquanto os santos só o são pelo reconhecimento dos outros.

Quanto à festa em sua honra, a autorização apostólica para veneração oficial da Rainha Santa decorreu daquele processo e, por isso, foi autorizada apenas no século XVII, depois da verificação e certificação da incorruptibilidade do seu corpo e das primeiras inquirições sobre o seu culto popular, pelo que só a partir de então terá começado a realizar-se também a sua festa, pelo aniversário do seu falecimento.

Mais antiga era já então a festa de São Bernardo, fundador de Cister, que tinha lugar no mês de Agosto, também a expensas do Mosteiro. Porém, depois de extintas as Ordens Religiosas e, nomeadamente, após o encerramento do cenóbio arouquense, a que também ajudou a proximidade das respetivas festas litúrgicas, a festa de São Bernardo foi substituída pela de São Bartolomeu. Associou-se-lhe depois uma componente em honra de Santa Mafalda e fizeram destas as popularmente designadas “Festas do Concelho”. A vertente profana destas acabou por prevalecer e, já em pleno século XX, acabaram por ser suplantadas pela Feira das Colheitas.

A festa da Rainha Santa, no entanto, resistiu à extinção do Mosteiro e aos intentos laicizantes. Quiseram mesmo os nossos maiores que o dia em que se assinala o falecimento de Dona Mafalda e em que continuou a realizar-se a sua festa prevalecesse sobre o dia em que os foreiros se viram livres dos pesados tributos ao Mosteiro, fazendo daquele também o dia do município e feriado municipal, o que muito beneficiou o seu culto e a sua festa, que ainda hoje se realiza e é bastante concorrida.

(publicado na edição do Roda Viva Jornal do mês de Abril)

sexta-feira, 15 de abril de 2022

A propósito das Procissões dos Fogaréus e do Enterro

Sai este número do Roda Viva quando estão a decorrer as solenidades da Semana Santa ou celebração litúrgica do Mistério Pascal, que consiste na paixão, morte e ressurreição de Cristo e, também assim, do Mistério do Calvário dum Cristo que sofreu e morreu, em sacrifício redentor, mas que ressuscitou, afirmando a vitória sobre a morte.

E, com efeito - é bom lembrá-lo - as tradições que por esta altura se recriam, com maior ou menor participação, radicam nesses acontecimentos, mas também na importância que os nossos antepassados lhe foram conferindo ao longo dos tempos, constituindo um legado material e imaterial, de fé, devoção, história e tradição, que ainda hoje irradia por cá uma intrínseca e incontornável ambiência pascal, como não se sente em muitas outras terras.

Por n’Ele ver o paradigma das suas dificuldades e sofrimento, é o Cristo da Paixão e do Calvário que mais atrai e motiva também o povo crente de Arouca. Razão pela qual também aqui se começou a promover o culto do Cristo sofredor. Dentro do Mosteiro, porém, esse culto remontava já, pelo menos, ao século XV, sendo ainda hoje possível observar no Museu, entre outras, um conjunto de tábuas pintadas, dedicadas aos diferentes momentos deste tema.

Extramuros, no entanto, como se sabe, tudo se terá começado a popularizar, essencialmente, a partir da primeira metade da centúria de seiscentos, altura em que se instituiu a Misericórdia, se construiu a respectiva capela, e se resolveu iniciar a recriação dos Santos Passos de Cristo num itinerário compreendido entre a capela e um austero maciço granítico reservado à representação do desenlace da tragédia que nos haveria de salvar, tal qual o percurso feito pelo Nosso Salvador entre o Pretório e o Calvário de Jerusalém.

Para esse efeito se organizaram desde logo alguns Irmãos sob a forma de Confraria, pese embora só em 1626 tenham resolvido firmar um termo, para nunca mais ser revogado, acerca da forma como devia ser feita a procissão quaresmal. E assim, de acordo com esse termo, a procissão deveria seguir o itinerário que ainda hoje se mantém, ao longo do qual se deveriam fixar e armar os respectivos Passos, mandando, desde logo, erigir também os primeiros cruzeiros do Calvário.

A Procissão dos Passos, com as componentes que lhe são próprias, começou então a realizar-se nessa forma e, tradicionalmente, havia nela lugar a três sermões: o do Pretório, ainda na capela da Misericórdia; o do Encontro, primeiro junto à (demolida) capela de São Gonçalo e, mais tarde, junto à capela de Santo António, onde aguardava o andor da Senhora das Dores; e o da Crucificação, já no púlpito do Calvário.

Porém, com o decorrer dos séculos, a procissão terá passado por algumas transformações e, por razões diversas, deixado até de se realizar por algumas ocasiões, sendo, no entanto, mais ou menos consensual na memória e escassa historiografia que, nos moldes tradicionais, se terá realizado até 1855, ano em que, alegadamente, terá sido substituída pela Procissão do Senhor Morto.

No entanto, para além de ser pouco provável essa substituição, aquela data não sinaliza sequer a altura em que terá começado a organizar-se a Procissão do Senhor Morto, também ela carregada do maior simbolismo. De resto, é muito provável que esta outra manifestação de religiosidade popular se realizasse já, pelo menos, desde meados do século anterior, por “incentivo” do Senhor Morto de Rossas, que, para esse efeito, vinha em procissão daquela freguesia para a vila, como se pode deduzir pelo Auto da Sessão da Câmara de 4 de Março de 1769, na qual foi requerido que se mandasse compor as poldras do rio para no dia seguinte vir a procissão do Senhor Morto daquela freguesia para a vila e que por isso mesmo também deviam estar os caminhos aparados e preparados e que, por honra de Deus, se dignassem acompanhar a mesma procissão com corpo de justiça de onde melhor lhes parecesse.

É, pois, muito provável que a Procissão dos Passos tenha deixado de se realizar durante alguns anos e se tenha mantido, no entanto, a organização da Procissão do Senhor Morto. De resto, em abono desta tese, se refere na edição de 21 de Abril de 1886 da revista O Occidente: «As cruzes meio derruídas, o púlpito desmantelado, as velhas oliveiras que circundam o calvário, tudo atesta os séculos que teem passado por sobre o monumento e com eles as crenças que teem esmorecido. Não sabemos se ainda hoje ali se celebram práticas religiosas, mas se se celebram, estamos certos que não serão mais que um longínquo reflexo das que se celebraram…».

Em todo o caso, faz essa publicação a justiça de afirmar: «O calvário de Arouca é, sem dúvida, dos mais notáveis que se levantaram pelo país, para celebrar ao vivo, permita-se-nos a phrase, a grande tragedia do Gogotha, em que se comsummou o maior dos sacrifícios, na pessoa do filho de Deus», presenteando-nos ainda com uma bela gravura desse nosso monumento, o único Calvário classificado a nível nacional como Imóvel de Interesse Público.

Não muitos anos depois, conta-nos a edição de 10 de Abril de 1909 do jornal Gazeta de Arouca que: «Na quinta-feira Santa e sexta-feira da Paixão foi grande a concorrência de fiéis em visita à egreja matriz e capellas da Misericordia e de Santo António, d’esta villa. Na quinta-feira, pelas 5 horas da tarde, houve sermão na mesma egreja pelo distincto orador sagrado rev.mo sr. padre Albino Moreira de Sousa e à noute sahiu da capella da Santa Casa da Misericórdia a antiga procissão dos Fogareos. Na sexta-feira realisou-se de tarde, com maior imponência e religiosidade, a procissão do Enterro, que sahiu da egreja do extincto convento. Antes e depois pregou o mesmo orador, produzindo, os seus primorosos discursos, excellente impressão na selecta e numerosíssima assistência.»

De então até hoje, pese embora mais um ou outro ano em que, por razões diversas, não se realizou uma ou outra, as antigas e tradicionais Procissões do Senhor dos Passos, agora dita dos Fogaréus, e do Senhor Morto, agora dita do Enterro, persistem. Um bem-haja e boa Páscoa a quem nelas persiste, pela fé, devoção, história ou tradição!

(publicado na edição do Roda Viva Jornal do mês de Abril)

domingo, 16 de janeiro de 2022

100 ANOS DE TEATRO EM ROSSAS

Casa da Barroca

Há precisamente 100 Anos, no dia d’ontem, mas na tarde d’hoje, porque o dia 15 de Janeiro de 1922 foi a um domingo, deu-se a estreia do Teatro na freguesia de Rossas. É uma data importante e digna de ser assinalada, pois enraizou uma tradição que ainda hoje se mantém muito viva e fulgurante.

Os primeiros atores organizaram-se sob o nome “Grupo Dramático de Rossas” e a estreia deu-se numa simples loja, no lugar da Barroca (na imagem), onde se improvisou um palco para o efeito. Foi então que pisaram o palco pela primeira vez, sob orientação e apresentação de António de Almeida Brandão, de Telarda, Joaquim de Pinho Brandão, do Paço, António Vicente da Silva, da Póvoa, Manuel Vicente da Silva, dos Carreiros, Manuel de Pinho Brandão, da Portela, Joaquim Brandão, do Matinho, e Maria Rocha, da Portela, estes dois últimos a interpretar duas cançonetas.

O grupo, no entanto, era ainda integrado por Celeste Garrido Brandão, da Portela, António de Pinho Santos, do Boucinho, Manuel da Costa Pinho, do Vale, e Maria de Pinho Magalhães, do Paço.

Nas palavras de António de Almeida Brandão, «eram todos dotados de muito mérito na arte de representar, como já se disse; mas Joaquim de Pinho Brandão distinguia-se dos demais, pelo facto de saber música, estando apto a ensaiar os números musicados, que sempre era costume meter em todas as récitas, tanto mais que as senhoras eram excelentes cantoras».

A estreia foi abrilhantada pela também novel “Tuna de Rossas”, integrada por Manuel de Almeida Aguiar, da Costa, António da Costa Brandão, da Cavada, António Francisco Martins, da Barroca, Joaquim Ferreira de Vasconcelos, da Vinha, Joaquim de Pinho Brandão, do Souto, e José de Pinho, da Comenda, sob regência de Manuel Brandão Martins, da Barroca.

Foi tal o sucesso que, pouco depois, pelo Domingo Gordo de Entrudo, seguiram para Castelo de Paiva, em carro de cavalos e a patrocínio do senhor Dr. Adelino Gomes Moreira, da Casa da Póvoa, freguesia de Tropeço, que, entretanto, se encontrava a residir naquele concelho. No dia 4 de Março de 1922, foi o grupo convidado a tomar parte no espetáculo que se realizou na vila de Arouca, no qual participou já quase todo o elenco.

Parabéns a todos quantos mantêm viva essa bela tradição!

sexta-feira, 15 de outubro de 2021

A propósito da conversão de parte do Mosteiro em Hotel

Apesar de subsistirem ainda alguns argumentos - já não tanto para estar contra, mas para questionar os termos e condições daquela concessão e conversão -, julgo que os mesmos se desvanecerão muito rapidamente. Com efeito, nos termos em que foi feita a concessão, a conversão que agora se iniciará dará lugar à utilização que, para além do que lhe será próprio, inegavelmente, melhor e mais duradouramente assegurará a recuperação, preservação e dignificação de uma parte substancial do nosso Mosteiro, há muito quase totalmente devoluta e, nos últimos 135 anos, nunca integralmente acessível e aproveitada.

Porque, em boa verdade, reconheça-se, nenhuma outra das soluções que, em teoria, têm sido aventadas ao longo dos últimos tempos, cumpriria uma recuperação e utilização, na dimensão e duração previstas, com as especificidades e restrições compreendidas no respectivo caderno de encargos, para uma finalidade que em nada desmerecerá a dignidade do complexo monástico e da história que lhe é inerente. Muito pelo contrário! Pode até, e deve – pois outra coisa não faria sentido -, aproveitar aspectos e recuperar elementos dispersos dessa história como temática e decoração, recriando um cenário e ambiência de que não há memória.

De resto, e de forma a não desvirtuar a leitura do conjunto, tal como o conhecemos hoje, os termos da conversão proíbem expressamente a demolição ou remoção dos elementos existentes, a alteração volumétrica ou a modificação das fachadas, bem como a abertura de vãos ou o alargamento dos atuais. Salvaguarda a preservação ou restituição das características originais, da escadaria de aparato exterior, do pátio interior e algumas das demais dependências, bem como do edificado anexo, fonte e zona de mata existentes na Cerca.

Por outro lado, ao contrário do que se diz e ouve, aquela nunca foi - senão muito ocasionalmente, mas jamais integralmente - uma parte aberta e acessível ao público em geral, como é a maior parte das Alas Norte e Poente. Razão pela qual a conversão em unidade hoteleira não irá devolver aquela Ala e Cerca à comunidade ou impossibilitar esse acesso e fruição em virtude dessa “privatização”. Nem uma coisa nem outra, antes pelo contrário: a conversão prevista, para além de recuperar e valorizar, irá possibilitar, ainda que de forma condicionada à utilização própria ou autorização necessária, o acesso e fruição integral de espaços e dependências a que o cidadão comum jamais teve acesso.

Nem mesmo no período de decadência da vida monacal que se verificou entre 1834 e 1886 e, depois, de extinção e degradação, que se verificou até 1954. Com efeito, após a extinção do Mosteiro, aquela parte ficou ainda alguns anos reservada ao remanescente humano da comunidade religiosa sobrevivente à última Abadessa, composto por mais de meia centena de pessoas, a que se atribuiu também a posse provisória da Cerca, e a que se foram juntando depois, sob cedência e arrendamento, pessoas e famílias necessitadas de um tecto, o que formalmente sucedeu até 1926, mas se arrastou até depois de 1942, ano em que faleceu a benfeitora e guardiã Maria Rosa do Sacramento.

O que, apesar de tudo, obstaculizou a que ali se albergasse (para além de um ou outro serviço, como os CTT, aí instalados até 1963), um Centro de Assistência aos Alienados do Hospital de Rilhafoles, um Estabelecimento Prisional, um Asilo para Inválidos das Grandes Guerras ou o Hospital da Misericórdia, entre outros. E evitou que aquela Ala, apesar da comiseração que nos ficou impregnada por séculos de influência cisterciense, tivesse sido descaracterizada e destinada ao acesso e permanência exclusiva dos alienados, prisioneiros, inválidos ou enfermos e pessoal de alguma das respectivas instituições. O que poderia suceder ainda hoje por alguma delas, caso o incêndio de 1935 e o ciclone de 1941 não tivessem degradado ainda mais as condições daquela parte e colocado cobro àquelas intenções, obrigando a um investimento maior.

Mas mesmo depois da recuperação profunda realizada a partir de meados do século passado, motivada pela instalação do Colégio Salesiano, que ali funcionou entre 1960 e 1982, a que sucedeu a cedência provisória da parte nascente à Delegação da Direcção Regional de Agricultura do Norte, que ali funcionou de 1986 a 2006, e do primeiro piso e piso térreo da parte poente à Associação de Defesa do Património Arouquense e Centro de Arqueologia de Arouca, que ali estiveram, muito legitimamente, sediadas desde a década de oitenta até agora, nunca aquela parte esteve aberta e acessível ao público em geral, nem sequer na disponibilidade do município, que foi mero usufrutuário e administrador de 1900 a 1992.

Pelo que, sem referir outros aspectos do mais que essa conversão e utilização nos pode trazer, devemos dar graças pelo rumo da história, por aquela Ala estar hoje totalmente livre e disponível para uma utilização duradoura e de qualidade que, para além de recuperar e preservar também espaços totalmente devolutos e degradados, nunca integralmente acessíveis e aproveitados, muito contribuirá para a manutenção e dignificação do nosso Mosteiro. Oxalá avance e se concretize!

(publicado na edição do Roda Viva Jornal do mês de Outubro)

quinta-feira, 17 de dezembro de 2020

Boas memórias...

Foto: Óscar Valério

Esta pureza imprimida pela brancura
Que pinta e atenua o todo musgado
Faz esquecer a rudeza da pedra escura
Alicerce da capelinha branco caiado

Alicerce da capelinha branco caiado
Testemunha de encontros e estórias
De quem ali se tornou enamorado
De um futuro rico de boas memórias

De um futuro rico de boas memórias
Dos amores ali prometidos e jurados 
Porque não eram promessas ilusórias
Até os amores que se viram acabados

Até os amores que se viram acabados
Apesar de prometidos para toda a vida
Por frases e corações agora musgados
Que se nos revelam à neve derretida

António Brandão de Pinho

segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

Aqui no alto…


Ergueram-se aos Céus por Fé e devoção
A capelinha, a casa da ceia e o Cruzeiro
Neste monte entre a Freita e Gamarão
Onde se fez lenda o cristão prisioneiro

Onde se fez lenda o cristão prisioneiro
dentro de uma arca segura por uma mó
por fazer preces neste monte altaneiro
Viu-se molestado sem piedade nem dó

Viu-se molestado sem piedade nem dó
Sem nunca ceder à sua Fé e devoção
Ficou para sempre da Senhora da Mó
Este monte entre a Freita e Gamarão

Este monte entre a Freita e Gamarão
Que do vale se levanta sobranceiro
Encimado pela Cruz acesa na escuridão
Onde se fez lenda o cristão prisioneiro

António Brandão de Pinho

sábado, 17 de outubro de 2020

Torrão Natal


Guardado por alterosas montanhas
Nas suas faldas roçadas encaixado
Este vale de qualidades tamanhas
P'los caprichos orográficos afagado

P'los caprichos orográficos afagado
Pela intercessão Mariana protegido
Um destino sempre muito desejado
Por quem nele se viu à vida trazido

Por quem nele se viu à vida trazido
Nos seus campos desenvencilhado
Nunca será deste vale desaparecido
Pois a ele estará sempre destinado

Pois a ele estará sempre destinado
Quem vai com o aperto da saudade
Para realização do sonho desejado
De nele vir completar a felicidade

António Brandão de Pinho

segunda-feira, 5 de outubro de 2020

5 de Outubro – uma data esquecida em Arouca


















O 5 de Outubro, que nos recorda a data em que se proclamou e implantou a (Primeira) República, pondo fim a mais de sete séculos de Monarquia, mas que também desta, por coincidência, nos recorda a data do "seu começo", pela assinatura do Tratado de Zamora em que Afonso VII de Leão e Castela reconheceu Portugal como reino independente, sendo por isso uma data histórica muito significativa, parece nada dizer à vila de Arouca, que sobre aquela também nada nos tem a contar.

Com efeito, não há na nossa vila uma praça, avenida, rua, travessa, viela, beco ou cantinho, que assinale essa efeméride, afirmando e perpetuando a sua relevância histórica. Nem 5 de Outubro nem República! O que é mesmo um caso raro em todo o país.

É verdade que já existiu, mas há muito deixou de existir e nunca mais se recuperou. Com a implantação do regime republicano em Portugal a principal rua da vila passou a denominar-se Rua 5 de Outubro, tendo passado, mais tarde, a denominar-se Avenida da República. Porém, fruto de circunstâncias d’época, alterou-se depois para Avenida Dr. Oliveira Salazar, posteriormente para Avenida Movimento das Forças Armadas, a seguir para Avenida das Descobertas e, finalmente, para Avenida 25 de Abril. A atual Praça do Município, depois de Praça Arantes de Oliveira, chegou também a denominar-se Largo 5 de Outubro.

De tantas denominações e se lhe souber o histórico - impossível de elencar na respetiva placa toponímica -, pode até dizer-se que em Arouca existe a avenida dos regimes, por excelência. Se bem que, atento o que é referido no preâmbulo do Regulamento Municipal de Toponímia do Município, à luz d’hoje, nenhuma daquelas alterações se rodeou de qualquer cuidado específico ou pautou por critérios de rigor, coerência, isenção e seriedade. Apenas se impuseram sucessivamente umas em prejuízo das outras.

Porém, como é evidente, não é igual a relevância histórica de todos os acontecimentos ou circunstâncias políticas subjacentes àquelas denominações. Não faz até qualquer sentido que existam hoje algumas delas nem que coexistam a maior parte. Mas, na minha modesta opinião, faz todo o sentido recuperar e atribuir a denominação "5 de Outubro" ou "República" a uma das artérias ou a um dos espaços da nossa vila. Tanto mais quando ainda recentemente se atribuiu o topónimo Liberdade, que está para 25 de Abril de 1974, como República está para 5 de Outubro de 1910.

Esse esquecimento - pese embora seja muito significativo na sede do município -, no entanto, não varre todo o concelho. freguesia de Mansores, para além doutras datas historicamente relevantes, atribuiu a uma das suas artérias a designação de Rua 5 de Outubro.

Publicado originalmente no blog Defesa de Arouca, em 3.X.2020.

terça-feira, 26 de março de 2019

terça-feira, 26 de junho de 2018

Inauguração da Sala D. Domingos de Pinho Brandão

Conforme aqui dei nota, teve lugar no passado sábado, dia 23 de junho, a inauguração da Sala dedicada a D. Domingos de Pinho Brandão no Museu de Arte Sacra e Arqueologia do Porto, anexo à igreja dos Grilos e Seminário Maior de Nossa Senhora da Conceição.

Cónego Pe. José Alfredo Ferreira da Costa no uso da palavra
A cerimónia foi presidida por D. Manuel Linda, Bispo do Porto, tendo nela marcado presença a Doutora Fernanda Ribeiro, Directora da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, entre outras personalidades ligadas ao Museu, ao Seminário, à Faculdade e a D. Domingos de Pinho Brandão, todos recebidos pelo Cónego Pe. José Alfredo Ferreira da Costa, Reitor do Seminário e Director do Museu.

com o Sr. Cónego Pe. José Alfredo Ferreira da Costa
Esta Sala, dedicada ao fundador do Museu, é a concretização de uma iniciativa do actual Reitor do Seminário e Director do Museu, com o intuito de homenagear o Senhor D. Domingos e ajudar na interpretação da origem e fundação deste Museu. O qual é constituído, essencialmente, por achados arqueológicos e bens de arte sacra recolhidos e cedidos pelas paróquias da Diocese do Porto, a pedido do próprio Senhor D. Domingos, em meados do século passado, quando era ainda padre e professor do Seminário.

Perspectiva de uma das alas do Museu
Serviu também esta iniciativa para reunir num só e mesmo espaço os antigos painéis que pertenceram à igreja paroquial de Rossas, em Arouca, terra da naturalidade do Senhor D. Domingos.
Este, de resto, tal como a referenciação, nomeadamente com a indicação do local de origem, era um dos dois objectivos perseguidos por mim desde que, há já alguns anos, se encontraram e identificaram os referidos painéis.
Neste particular e a este propósito, tudo o que tem sido feito lá, no Porto, desde que se encontraram e identificaram os painéis, deve-se ao amigo Senhor Cónego Pe. José Alfredo. Rossas deve estar-lhe, pois, muito grata e os rossenses não podem deixar de ir visitar aquele Museu.
Oxalá que a paróquia e/ou freguesia de Rossas sejam agora sensíveis ao assunto e diligenciem pela produção de réplicas, colocando-as, devidamente referenciadas, na igreja ou no museu paroquial de Rossas.